Conselho de Medicina estabelece cesáreas só a partir da 38ª semana da gestação

thumb (1)Em uma reação ao conjunto de medidas lançado pelo Ministério da Saúde para incentivar o parto normal, o Conselho Federal de Medicina (CFM) editou uma resolução afirmando ser ético o médico atender à solicitação da gestante e realizar a cesárea. A norma, que entra em vigor nos próximos dias, estabelece apenas que a cirurgia, quando feita a pedido, deve ser feita somente a partir da 38ª semana de gestação e que um termo de consentimento deve ser assinado pela paciente.

O presidente do CFM, Carlos Vital, afirmou que o prazo agora estabelecido tem como objetivo proteger bebês. Cesáreas feitas antes desse período, informou, podem aumentar o risco de a criança ter problemas respiratórios, icterícia e em casos mais graves lesões cerebrais. “Não podemos dizer que ocorriam abusos por parte dos médicos. Não havia um consenso sobre o prazo ideal para realização do procedimento”, disse. De acordo com Vital, em alguns casos, há erros no cálculo do período gestacional, aumentando o risco de a cesárea ocorrer quando o bebê ainda é prematuro.

Estudos feitos pelo pesquisador César Victora, da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), indicam um aumento expressivo de bebês prematuros no Brasil, um problema a que ele associa ao aumento nas taxas de cesárea ocorridas em todo o País.

Dados do Ministério da Saúde indicam que 84% dos nascimentos na rede privada do País ocorrem por meio da cirurgia. Na rede pública, há também uma tendência de aumento desse tipo de procedimento. Os dados mais recentes indicam que 40% dos nascimentos na rede pública ocorrem também por cesárea.

Vital afirma não haver um padrão mundial sobre o porcentual aceitável desse tipo de procedimentos. Tal medida ainda está em avaliação, informou. “A Organização Mundial de Saúde trabalha numa tabulação, mas acredita-se que ela gire em tono de 30%”, disse. O presidente do CFM disse não ter uma explicação sobre as razões que levam o Brasil a apresentar taxas de cesáreas tão altas. “Não posso dizer. Para isso teria de haver um estudo epidemiológico correto” , disse.

Entre as causas que poderiam contribuir para os indicadores, afirmou, pode estar uma elevada taxa de mulheres que tenham trauma do parto normal. “Qual a taxa desse grupo, por problemas culturais, regionais distorcidos desde a infância? Esse é um problema multifatorial.” Vital afirma que se não há nenhuma contraindicação para que o parto seja normal, essa deve ser a escolha. “Riscos e benefícios têm de ser apresentados de um e outro”, completou.

Para o presidente do CFM é preciso acabar com o trauma. “As culturas são estabelecidas gerando os traumas.” A norma do CFM também desobriga o médico a fazer o parto normal, desde que ele discorde com esse procedimento. Para o presidente da entidade, quando isso ocorrer, caberá à operadora de saúde, no caso de assistência suplementar, ou ao sistema público ofertar o médico que faça o parto normal para paciente que tiver condições para isso.

“O problema é que muitas operadoras não oferecem essa garantia. Faltam leitos. Tanto é que o maior ressarcimento de operadoras para o SUS (pagamento que empresas fazem ao governo no caso de seus clientes serem atendidos no sistema público) ocorrem por parto normal”. Vital descartou a possibilidade de que a nova norma vá incentivar a realização de cesáreas. Para ele, a regra vai apenas trazer maior proteção ao bebê, por causa do limite mínimo das 38 semanas. A regra, na avaliação do CFM, vai trazer um reflexo às regras lançadas no início do ano passado pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).

Em janeiro de 2015, para tentar reduzir as cesáreas, a autarquia lançou uma série de regras, que previam desde a divulgação de indicadores sobre cesáreas realizadas por médicos e hospitais até a apresentação de um partograma, um histórico sobre o parto.

Esse documento se tornou indispensável para o ressarcimento de profissionais. Para o CFM, desde que a paciente e o médico apresentem um termo de consentimento, declarando a intenção do parto cesáreo, o partograma se torna desnecessário. Vital afirmou que o conselho vai fiscalizar o cumprimento da regra. Caso ela seja desrespeitada, o profissional está sujeito a um processo por infração ética. As penas podem variar de advertência à cassação.

Carlos Vital

O presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM), Carlos Vital, disse que a cultura da população brasileira pode ser um dos fatores que provocam as altas taxas de cesárea no País. “Por que se coloca a dor do parto é a pior do mundo? As culturas são estabelecidas gerando traumas.” Vital afirmou que cabe ao profissional deixar claro que, se não há nenhuma contraindicação, o parto normal deveria ser a primeira escolha. “Se há médicos que fazem diferente, é como jornalista que não é ético e magistrado que tergiversa.”

“Não há como justificar porque o Brasil tem números tão elevados do procedimento. Para isso seriam necessários estudos epidemiológicos corretos. Por exemplo, qual é a taxa de mulheres brasileiras que têm trauma do parto normal? Por problemas culturais e educacionais distorcidos desde a infância? É preciso fazer uma série de trabalhos. É multifatorial. Há críticas de que muitos médicos induzem o parto cesáreo. Isso pode contribuir para os indicadores.”

“Não se trata de indução. Médicos têm de alertar que, se não há nenhuma contraindicação para o parto normal essa é a via de eleição. O médico tem de deixar claro os riscos e benefícios de um procedimento e outro. Se há médicos que fazem diferente é como jornalista que não é ético, é como magistrado que tergiversa. Em síntese, toda profissão tem homens dos quais ela se orgulha e outros que ela renega. Na medicina, não é diferente. Não posso dizer que índices são esses. Estudos metódicos, epidemiologia tem de ser levantada. E tem de se acabar com o trauma. Por que se coloca a toda hora a dor do parto como a pior do mundo? As culturas são estabelecidas gerando os traumas.”